Paralelas Abissais

Não era a primeira vez que olhava para baixo e pensava pular daquele oitavo andar. Seria questão de segundos e seu corpo  num voo abissal logo estaria esfacelado no duro asfalto e tudo estaria acabado e pouco em breve quem se lembrariam de mais um ato suicida. Iria ser apenas mais um desesperado, entre tantos outros jovens para os quais não foi dito que viver não é tão maravilhoso como apregoam. Sua vida tornou-se um encadeamento inesgotável de desenganos.




Nunca lhes ensinaram a se fortalecer para as intempéries. Uma fé desmedida e insensata o levou a confiar demasiadamente no homem. Fora demasiadamente ingênuo. E até agora demasiadamente indeciso, senão não estaria mais ali olhando para baixo se imaginando um pássaro voando para um mergulho, o seu último, rumo ao nada.

Aquela ideia cada a cada dia parecia se fortalecer. Há poucos dias ensaiou um pulo final. Mas esse não passou de uma imitação grotesca do saltitar de um bebê canguru. Voltou para seu sofá e reiniciou sua rotina marasmática. Já era o terceiro março de cigarro que abrira naquele dia. Que se danem os conselhos médico, eles também morrem de avc, cirrose, trombose e outras infectites ou de outros males que lhes fazem lembrar, a despeito da empáfia de muitos, que são humanos e padecem dos mesmos males que nós. Que se danem com suas receitas paliativas, navegamos no mesmo mar revoltoso. Não era a primeira vez que olhava para baixo e pensava pular daquele oitavo andar. Seria questão de segundos e seu corpo  num voo abissal logo estaria esfacelado no duro asfalto e tudo estaria acabado e pouco em breve quem se lembrariam de mais um ato suicida. Iria ser apenas mais um desesperado, entre tantos outros jovens para os quais não foi dito que viver não é tão maravilhoso como apregoam. Sua vida tornou-se um encadeamento inesgotável de desenganos. Nunca lhes ensinaram a se fortalecer para as intempéries. Uma fé desmedida e insensata o levou a confiar demasiadamente no homem. Fora demasiadamente ingênuo. E até agora demasiadamente indeciso, senão não estaria mais ali olhando para baixo se imaginando um pássaro voando para um mergulho, o seu último, rumo ao nada. Aquela ideia cada a cada dia parecia se fortalecer. Há poucos dias ensaiou um pulo final. Mas esse não passou de uma imitação grotesca do saltitar de um bebê canguru. Voltou para seu sofá e reiniciou sua rotina marasmática. Já era o terceiro março de cigarro que abrira naquele dia. Que se dane os conselhos médico, eles também morrem de avc, cirrose, trombose e outras infectites ou de outros males que lhes fazem lembrar, a despeito da empáfia de muitos, que são humanos e padecem dos mesmos males que nós. Que se danem com suas receitas paliativas, navegamos no mesmo mar revoltoso.

A música continuava a ecoar em alto som. Parecia querer dizer para os vizinhos que não estava só. Tinha a companhia de Belchior, no momento fazendo-o olhar, mais uma vez, para as paralelas das pistas, lá embaixo, com tortuosas curvas e retas, com altos e baixos como os caminhos de sua vida. E agora com mais baixadas que se avizinhavam a cada dia do fundo do poço. Andava de lá pra cá repetindo as frases daquele cantor que dizia estar a cem por ora e só tinha o carinho do motor. Feliz dele que ainda sentia alguma coisa andava livre por ai. E ele enclausurado num eterno retorno contínuo para o nada ou para a inutilidade de reviver o passado.

Sentava, fumava, ia à geladeira e invariavelmente pegava o telefone e falava frases desconexas entremeadas de pedidos de perdão ou súplicas de retorno.  O que era infalível era seu olhar para a janela e pensar no salto definitivo. Atualmente ele e, involuntariamente, seus vizinhos ouviam diariamente numa repetição obsessiva Lupicínio Rodrigues cantando: “Quem sou eu pra ter direitos exclusivos sobre ela…” e Nelson Gonçalves: “Tire o seu sorriso da minha frente, que eu quero passar com minha dor…”.

Aquela janela bem que poderia se prestar, para além de relembrá-lo de saltar como um pássaro desalado. Poderia muito bem num lance milagroso, fora de todos os parâmetros aceitáveis, ela surgir ali, vinda não sei como, contrariando todos os processos lógicos e dizer: “Para de pensar em pular no vazio e pule sobre meu corpo e faça nele suas retas, suas paralelas, passei em seus montes e crateras e se afogue em minha boca e fiquemos unidos como duas paralelas que enfim se encontraram. Para que pular na vertical se podemos ficar tão unidos na horizontalidade, nos unindo na tentativa de nos tornar apenas uma paralela indissolúvel”. De volta à sua alucinação constante voltou ao sofá, acendeu mais um cigarro e fixou o olhar para a janela agora com mais determinação.

Assis Coelho
Bsb, 8/7/20717

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